segunda-feira, 10 de setembro de 2007

O INSIGNIFICANTE E O EXTRAORDINÁRIO

"O insignificante e o extraordinário são os arquitetos do mundo natural". Conheci esta curiosa frase num dos episódios da série Cosmos, de Carl Sagan. No contexto do vídeo, a frase referia-se ao efeito destrutivo gerado pelo impacto de minúsculos grãos de areia colidindo contra um enorme rochedo. Os insignificantes grãos de areia conseguiam, ao longo dos milênios, destruir completamente um rochedo aparentemente inabalável com um efeito similar ou superior a um extraordinário terremoto. Daí a frase: "o insignificante e o extraordinário são os arquitetos do mundo natural", pois tanto os insignificantes grãos de areia quanto o extraordinário terremoto alcançavam os mesmos resultados. Por algum motivo, esta frase ficou guardada em minha memória competindo com outras informações que, honestamente, me pareciam bem mais úteis. No entanto, um dia finalmente compreendi o motivo dela ter chamado tanto a minha atenção. Sou professor de Yôga Antigo e enfrento, na rotina do meu trabalho, a dificuldade de conscientizar meus alunos quanto à importância de preservarmos nossa cultura milenar. Então, a analogia tornou-se clara em minha mente. Imaginei cada um de nós, insignificantes seres humanos, colidindo com a nossa ignorância contra o grandioso patrimônio do Yôga Antigo. Através dos milênios, um após o outro, vamos corrompendo a integridade da cultura ancestral, ora com negligência ao descuidar dos detalhes, ora com arrogância ao supor que podemos adaptar o conhecimento às necessidades do nosso ego. Lamentavelmente, nossa visão limitada nos impede de perceber o efeito corrosivo que ocasionamos ao longo do tempo. Portanto, hoje, quando enfrento o desafio de levar esta consciência a um aluno, sempre utilizo a frase de Carl Sagan. Crio, na mente dele, uma imagem clara dos insignificantes grãos colidindo e corrompendo, pouco a pouco, a integridade do enorme rochedo. Depois pergunto se, ao alterarmos uma vírgula, um acento, um adjetivo ou qualquer coisa num texto da tradição, não estaríamos agindo com a mesma inconsciência (para não dizer coisa pior) dos insignificantes grãos de areia.
(texto prof. Mallet)

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